Na manhã de 2 de abril de 2025, os portos da Europa começaram a acumular carros que não cruzariam o Atlântico. A Audi, marca de luxo do grupo Volkswagen, anunciou a retenção de seus veículos novos destinados aos Estados Unidos. No dia seguinte, a Jaguar Land Rover, símbolo da indústria britânica, engrossou a lista: os carros fabricados no Reino Unido ficariam em terra firme por tempo indeterminado. O motivo é uma tarifa de 25% sobre automóveis importados, decretada pelo governo de Donald Trump como parte de uma ofensiva protecionista que também elevou taxas sobre aço, alumínio e etanol. Enquanto o mercado americano entra em turbulência, o Brasil, habituado a barreiras mais altas, observa como quem já conhece o roteiro.
A política americana, em vigor desde 3 de abril, surpreendeu as montadoras. O grupo Volkswagen reteve os Audi nos portos europeus e suspendeu os embarques ferroviários de carros produzidos no México para os EUA. A Jaguar Land Rover pausou as remessas para recalcular estratégias. Nos EUA, concessionárias preveem estoques reduzidos e preços mais altos, sobretudo para modelos premium importados. A BMW e a Mercedes-Benz, com fábricas locais em estados como Carolina do Sul e Alabama produzindo SUVs como o X5 e o GLE, escapam parcialmente do impacto. Já a Porsche, também do grupo Volkswagen, enfrenta pressão por depender de linhas europeias, mas ainda não especificou suas ações.
Por outro lado, Trump sinalizou abertura para negociações, o que levanta a possibilidade de as tarifas de 25% sobre carros importados baixarem nos próximos dias ou semanas. Desde o anúncio das medidas, mais de 50 países, incluindo Japão, Reino Unido e Vietnã, contataram o governo americano buscando acordos para reduzir ou eliminar as taxas. O presidente tem se mostrado receptivo, sugerindo que “muitos países” estão oferecendo propostas para equilibrar o comércio. No entanto, assessores como Peter Navarro afirmam que as tarifas não são apenas uma tática de barganha, mas uma resposta a déficits comerciais vistos como emergências nacionais. Essa dualidade – negociar, mas manter pressão – deixa o futuro incerto. As tarifas começaram a ser coletadas, mas ajustes podem surgir se acordos bilaterais avançarem rapidamente.
Nos EUA, os 25% marcam uma ruptura com a média histórica de 2,2% sobre importações brasileiras até março de 2025. O aço, antes taxado em 0,9%, e o etanol, em 2,5%, agora enfrentam 25% e 18%, respectivamente. No Brasil, a realidade é outra: carros importados pagam 35%, e a média sobre bens americanos é de 11,3%, caindo quando se pesa o volume de commodities como petróleo, que entram com taxas baixas. O aço americano já enfrenta de 7,2% a 25% aqui, e bens industriais podem ultrapassar 50% sem isenções. Os 25% de Trump são altos para os EUA, mas não chegam ao protecionismo crônico brasileiro.
A decisão da Jaguar e da Audi de congelar exportações para os EUA é lógica no curto prazo, mas depende do desenrolar das negociações. Se as tarifas caírem em breve – digamos, em dias ou semanas, como resultado de acordos rápidos com Reino Unido ou Alemanha –, a pausa evita perdas com taxas altas que logo poderiam ser reduzidas. Por outro lado, se Trump mantiver os 25% como política fixa, o atraso apenas adia o inevitável ajuste de preços ou realocação de mercados. A Volkswagen, por exemplo, já segura carros no México, apostando em uma solução via USMCA (acordo com EUA, México e Canadá), que pode oferecer isenções. O risco é que, sem clareza imediata, estoques acumulados gerem custos extras, enquanto concessionárias americanas pressionam por suprimentos.
O impacto global se intensifica. Montadoras recalibram cadeias de produção, e o México vira um enigma logístico. Nos EUA, um Audi Q5 ou Jaguar F-Pace pode encarecer milhares de dólares. No Brasil, o efeito é indireto: menos vendas americanas podem cortar a demanda por aço e alumínio locais. Trump insiste em proteger a indústria dos EUA, mas a abertura para negociar sugere flexibilidade – talvez o suficiente para justificar a cautela de Audi e Jaguar. Por ora, o mundo automotivo segue em compasso de espera, entre tarifas fixas e promessas de acordos.
Imagem: desenho de um Land Rover se afastando da Estátua da Liberdade. Arte/Blogolandia.
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