No coração de São Vicente, no litoral sul de São Paulo, uma pequena oficina se tornou palco de uma façanha que está chamando a atenção do mundo automotivo. Caio Strumiello, um mecânico de 53 anos conhecido localmente como o “Inventor de São Vicente”, criou o Nanico P50, um veículo que reivindica o título de menor carro do mundo. Com dimensões impressionantemente reduzidas, o microcarro brasileiro desafia o lendário Peel P50, produzido na década de 1960 pela Peel Engineering Company, na Ilha de Man, e até mesmo faz com que uma motocicleta como a Honda CG160 pareça grande em comparação. Este é o relato de um projeto que combina criatividade, engenhosidade e uma pitada de ousadia, trazendo à tona uma nova perspectiva sobre mobilidade urbana.
O Nanico P50 é uma obra-prima de compactação. Com apenas 1,33 metro de comprimento, 78 centímetros de largura e 1,03 metro de altura, o veículo é tão pequeno que cabe facilmente em um elevador residencial. Construído em apenas 20 dias, o microcarro foi projetado com base em uma cadeira de rodas motorizada, uma das invenções anteriores de Strumiello, que já tem experiência em criar veículos adaptados para pessoas com mobilidade reduzida. A carroceria, feita de fibra de vidro, é leve e resistente, com um para-brisa de acrílico e rodas de aro 10 que reforçam sua estética minimalista.
O Nanico P50 é movido por um motor a gasolina de até 100 cilindradas, semelhante ao usado em ciclomotores, o que lhe confere uma velocidade máxima de aproximadamente 60 km/h, embora o inventor afirme que, em condições ideais, o carro possa alcançar até 80 km/h. Sua eficiência é outro destaque: o veículo consome apenas um litro de gasolina para percorrer entre 40 e 45 quilômetros, tornando-o uma opção extremamente econômica para deslocamentos urbanos. Apesar do tamanho reduzido, o Nanico surpreende por sua funcionalidade. Ele possui marcha ré, buzina e, segundo seu criador, é capaz de transportar até duas pessoas – desde que sejam de baixa estatura e dispostas a viajar bem apertadas.
O design do Nanico P50 é despojado, mas funcional. Em vez de um volante convencional, o carro é dirigido por um manche, uma solução inspirada na acessibilidade para pessoas com limitações motoras. A ausência de instrumentação tradicional, como velocímetro, reflete a simplicidade do projeto, que prioriza praticidade e economia. Ainda assim, o veículo não é apenas uma curiosidade: para circular legalmente, ele precisa atender a exigências rigorosas de homologação, incluindo a obtenção de certificados de segurança veicular e adequação à legislação de trânsito, além de inspeções técnicas.
O Nanico P50 foi diretamente inspirado no Peel P50, um ícone automotivo que detém, desde 2010, o título de menor carro de produção em série do mundo, segundo o Guinness World Records. Produzido entre 1962 e 1965, o Peel P50 é um veículo de três rodas com 1,34 metro de comprimento, 99 centímetros de largura e 1,20 metro de altura. Comparado ao Nanico, o modelo brasileiro é ligeiramente menor em todas as dimensões: 1 centímetro mais curto, 21 centímetros mais estreito e 17 centímetros mais baixo. Essa diferença, embora pequena, é suficiente para que Strumiello reivindique o recorde mundial, embora o Nanico ainda não tenha sido oficialmente reconhecido pelo Guinness.
Enquanto o Peel P50 foi projetado para ser um carro urbano de um único ocupante – anunciado como capaz de carregar “um adulto e uma sacola de compras” –, o Nanico P50 vai além ao oferecer espaço, ainda que limitado, para duas pessoas. Outra vantagem do modelo brasileiro é sua configuração de quatro rodas, que proporciona maior estabilidade em comparação com o design de três rodas do Peel, que tem apenas uma roda dianteira e duas traseiras. Além disso, o Nanico inclui marcha ré, um recurso ausente no Peel P50 original, que dependia de um cabo traseiro para ser fisicamente manobrado em manobras de ré.
O Peel P50 usava um motor de 49 cc de dois tempos, produzindo cerca de 4,2 cavalos e alcançando uma velocidade máxima de 61 km/h. Seu consumo era igualmente impressionante, com cerca de 42 km por litro. Embora o Nanico P50 seja comparável em eficiência, sua construção artesanal e o uso de um motor de até 100 cilindradas o tornam mais versátil em termos de desempenho. No entanto, o Peel P50 tem a seu favor a aura de um clássico, com apenas cerca de 50 unidades produzidas originalmente, das quais menos de 30 ainda existem, algumas valendo mais de US$ 120 mil em leilões.
Para contextualizar o tamanho do Nanico P50, uma comparação com a Honda CG160, uma das motocicletas mais populares no Brasil, é reveladora. A CG160, um modelo amplamente utilizado para deslocamentos urbanos e entregas, tem aproximadamente 2,03 metros de comprimento, 83 centímetros de largura e 1,09 metro de altura. Em comparação, o Nanico é 70 centímetros mais curto, 5 centímetros mais estreito e apenas 6 centímetros mais baixo. Em termos de peso, a CG160, com cerca de 120 kg, é significativamente mais pesada que o Nanico, que, embora não tenha seu peso exato divulgado, é descrito como extremamente leve devido à sua construção em fibra de vidro.
Enquanto a CG160 é projetada para agilidade e eficiência em duas rodas, com um motor de 160 cc que entrega cerca de 15 cavalos, o Nanico P50 oferece a vantagem de uma cabine fechada, protegendo o motorista de intempéries, algo que nenhuma motocicleta pode proporcionar. No entanto, a moto é mais rápida, com uma velocidade máxima de cerca de 100 km/h, e mais prática em termos de manobrabilidade em trânsito intenso. Por outro lado, o Nanico se destaca pela capacidade de estacionar em espaços minúsculos e pela economia de combustível, que rivaliza com a da CG160, que faz cerca de 35 a 40 km por litro.
O Nanico P50 não é apenas uma façanha técnica, mas também um símbolo de inovação em um país onde a produção automotiva artesanal enfrenta barreiras significativas. Caio Strumiello sonha em transformar seu microcarro em um produto comercial, estimando que, com um investimento de R$ 4 milhões, poderia fabricá-lo em escala por cerca de R$ 10 mil por unidade. Esse preço o tornaria uma alternativa acessível para mobilidade urbana, especialmente em cidades congestionadas onde o espaço é um recurso valioso.
No entanto, a legislação brasileira impõe desafios. A produção de veículos artesanais é limitada a duas unidades por ano, e cada carro precisa passar por um rigoroso processo de homologação, incluindo certificações técnicas e registros no Detran. Apesar dessas barreiras, o Nanico P50 já conquistou admiradores. Vídeos compartilhados por Strumiello nas redes sociais mostram o processo de construção e o carro em ação, atraindo elogios de entusiastas e curiosos. Comentários como “Você é o melhor, Caio, só projeto top” refletem o impacto de sua criação.
O Nanico P50 é mais do que um veículo; é a materialização da inventividade de um mecânico que, com recursos limitados e uma visão ousada, desafiou os limites do que é possível no mundo automotivo. Ao superar o Peel P50 em compactação e oferecer funcionalidades modernas, como marcha ré e capacidade para dois ocupantes, o Nanico se posiciona como um marco na história dos microcarros. Comparado à Honda CG160, ele demonstra que é possível combinar a eficiência de uma motocicleta com a proteção de um carro, ainda que em escala reduzida.
Enquanto aguarda reconhecimento oficial, o Nanico P50 já conquistou seu lugar no imaginário popular. Ele representa a capacidade de inovação em contextos improváveis e aponta para um futuro onde a mobilidade urbana pode ser reinventada com criatividade e simplicidade. Em São Vicente, Caio Strumiello continua a trabalhar em sua oficina, sonhando com o dia em que seu pequeno grande carro ganhará as ruas – e, quem sabe, o mundo.
Assista ao vídeo:
Imagem: reprodução/Youtube/Tcarclips
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